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Jundiaqui

 MPB4 quebra esse silêncio todo que atordoa
6 de março de 2020

MPB4 quebra esse silêncio todo que atordoa

Músicos põem dedo na ferida reaberta da censura e público jundiaiense canta junto em defesa da democracia

Edu Cerioni

“Você Corta um Verso, Eu Escrevo Outro” na noite desta quinta-feira (5) levou um grande público ao Sesc Jundiaí para ovacionar o MPB4. A maioria saiu de lá mais engajada ainda na luta em defesa da democracia, porque cantou não só com a voz, mas com emoção, com o coração “que é um pote até aqui de mágoa” por conta dos últimos acontecimentos políticos. O recado foi dado em alto e bom som de que “esperar não é saber, quem sabe faz a hora e não espera acontecer”.

O público ouviu histórias de censura, viu fotos no telão dos tempos de direitos cassados, do “cale-se” que muitos insistem em dizer que não existiu e foi alertado por Aquiles Reis, Dalmo Medeiros, Miltinho e Paulo Malaguti Pauleira na base de sambas e outros ritmos que as sombras da repressão estão crescendo e é preciso “estar atendo e forte”.

O MPB4 tocou e cantou com um careca e três de cabelinhos brancos sentados, afinal só de estrada musical lá se vão 55 anos. Se falta perna, os braços e mãos dos músicos nos violões, percussão e teclado estão ótimos e a afinação vocal é quase a mesma de décadas atrás. Com energia, avisam que “podem me prender, podem me bater, podem até deixar-me sem comer que eu não mudo de opinião”: ditadura é um pesadelo.

O careca é Paulo, que substitui desde 2012 o falecido Magro Waghabi, lembrado com carinho por ser inspirador desse show, que trouxe muito de Chico Buarque e também de Geraldo Vandré, Gonzaguinha, Zé Keti, Sergio Ricardo, João Bosco, Paulinho Tapajós, Taiguará e até Adoniran Barbosa – sem citar que ele viveu aqui -, entre muitos outros. Adoniran foi lembrado porque censores queriam trocar letras do clássico “Tiro ao Álvaro”,  o que prova que é preciso muito cuidado a quem se oferece o poder.

O MPB4 se viu diante de um público comportado, também sentado em cadeiras espalhadas pela quadra ou na arquibancada do ginásio do Sesc – um único casal dançou -, mas não indiferente ao que acontece hoje no Brasil. Ouviu-se gritos como “Ele não!” e “Censura nunca mais”. Claro que tinha muito fã veterano ali, mas também jovens e crianças que acreditam que apesar dos tempos bicudos, “amanhã há de ser outro dia”.

Uma gostosa voz feminina de fundo ajudou a contar histórias entre uma música e outra. Era a de Claudia Castelo Branco, que foi lembrando dos problemas com a censura para o Secos e Molhados, para Raul Seixas e Paulo Coelho, para Luiz Melodia e Milton Nascimento etc. Contou que Genival Lacerda foi questionado pelos militares, por conta de um censor crescer o olho “na butique dela”. Até a dupla Dom e Ravel, que escreveu um ‘hino da ditadura’, o “Eu Te Amo Meu Brasil”, foi censurada por conta de “Animais Irracionais”.

Claudia falava de algum tipo de veto pelo governo nos anos de chumbo, como para a novela “Roque Santeiro”, além de filmes e peças de teatro, e o quarteto emendava sempre um “Cala a Boca, Bárbara!”, em um momento dos mais intensos do show.

De 1968 a 1978, lembraram que 1.662 perderam o direito político, época em que 500 músicas foram proibidas ou mexidas à força. E pensar que ainda hoje tem aqueles que acreditam que “não existe pecado do lado de baixo do Equador”.

Um show corajoso que estampou ainda fotos de torturados, protestos, assim como de “O Pasquim”, da Democracia Corintiana, de Caetano, do Henfil e, como não, de Marielle Franco, cuja morte é uma história com “sinal fechado para nós”.

A vereadora negra que foi assassinada no Rio de Janeiro em emboscada até hoje não esclarecida e na qual muitos se perguntam se tem familiar do presidente Jair Bolsonaro envolvido ou não, ganhou o telão no bis, quando o quarteto se tornou quinteto – com a presença no palco de Claudia – para lembrar que “chora a nossa pátria mãe gentil; choram Marias e Clarisses no solo do Brasil. Mas sei que uma dor assim pungente não há de ser inutilmente”.

Sim, todos saímos do Sesc com a certeza de que há esperança. “Acorda, amor!” Até porque “essa terra ainda vai cumprir seu ideal”…Em tempo: uma noitada de muitos encontros e até de parabéns a você pelo aniversário da jornalista Cristina Falasco (foto acima comigo).

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Fotos: Edu Cerioni

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