LOADING...

Jundiaqui

 Estudo de “estradas-parques” é iniciado pela Serra do Japi
20 de março de 2018

Estudo de “estradas-parques” é iniciado pela Serra do Japi

Por José Arnaldo de Oliveira

No ano em que se completam os 40 anos das históricas passeatas ecológicas dos jundiaienses em 1978, que ajudaram a conquistar o tombamento da Serra do Japi cinco anos mais tarde, um tema que busca organizar uma resposta à pressão de visitantes de parte dessa área finalmente parece avançar. É o conceito de estrada-parque.

Embora seja uma alternativa viável para todo o cinturão verde de bairros rurais do município, seu primeiro alvo, chamado inicialmente de “Estrada-Parque Santa Clara-Morangaba”, está dentro do território de gestão da serra.

O projeto, da Prefeitura de Jundiaí, coincide com outro paralelo, aprovado na Câmara, chamado de “Circuito Eco Esporte Santa Clara” – que de qualquer forma dependeria dessa regulamentação executiva.

A implantação do mecanismo de estradas-parque já foi debatida anteriormente tanto por colegiados específicos como o Conselho de Gestão do Território da Serra do Japi como por debates amplos como o Plano Diretor Participativo. Até mesmo um inspirador desenho estudantil em uma escola do bairro de Ivoturucaia surgiu de trabalhos em torno do tema.

Pesquisa – O assunto é a pauta de reunião aberta na manhã de 10 de abril, uma terça-feira, no auditório do antigo viveiro municipal (atual Unidam). Como convidado, o engenheiro agrônomo Ivan Suarez da Mota (da Fundação Florestal do Estado) relatará a pesquisa no âmbito de mestrado na Unicamp em torno da criação de uma estrada-parque entre Salesópolis e Caraguatatuba, no interior do Parque Estadual da Serra do Mar.

Entre a variedade de casos no Brasil e nos Estados Unidos, até mesmo exemplos vizinhos são citados como a Estrada-Parque Itu Cabreúva na margem do rio Tietê, do outro lado da Serra do Japi. Ainda entre os casos brasileiros está outra com mais de 100 quilômetros, a Estrada-Parque do Pantanal, no Mato Grosso do Sul.

O estudo cita ainda um especialista mundial, Marc Dourajeanni, para quem esse tipo de instrumento pode ser usado qualquer tipo de unidades de manejo – tornando em tese viável o seu uso em outras partes do município de Jundiaí, que tem seu território inteiro reconhecido como área de proteção ambiental (APA).

Sob pressão – O assunto emerge dentro de um processo permanente de pressão de ocupação residencial ou industrial não apenas em todo o “cinturão verde” do município, mas também e especificamente no próprio território de gestão da Serra do Japi e seu entorno.

Crescente na região da Malota, essa “pressão antrópica” humana se estende agora ao longo da linha da rodovia dos Bandeirantes até a região do Gramadão e dali para a região do Eloy Chaves e Ermida, com impacto futuro pela nova ligação viária entre a avenida Antonio Pincinato e a alça de transposição da rodovia Anhanguera.

Essa avenida, aliás, é sempre um dos casos cogitados para uma estrada-parque por ser a borda do território de gestão da serra.

Um dos focos prioritários de conservação da biodiversidade no país e no mundo, com grande quantidade de espécies de flora e fauna (algumas raras), a Serra do Japi tem somente uma pequena parte sob restrições máximas que é a Reserva Biológica Municipal, na sua parte mais alta e ainda insuficiente para as variedades de menor altitude, principalmente aquáticas. Mas todo o seu conjunto pode ser ameaçado a longo prazo se ficar isolado no fenômeno que alguns analistas chamam de “fóssil vivo”.

Proteção coletiva – A organização na demanda das pessoas para contato com a natureza é necessária para o uso sustentável ou a restrição de acesso. A estrada-parque, no caso da Serra do Japi, pode variar na dosagem – afinal um dos gatilhos da histórica passeata ecológica de 1978 foi o início de um condomínio de luxo no alto da Serra da Ermida, ainda existente, como sinal de alerta dessa pressão.

Em plena ditadura militar e sem internet, milhares de jovens jundiaienses caminharam da Praça da Bandeira até o Pico do Mirante e tiveram trilha sonora ao vivo permitida por geradores emprestados pelos bombeiros. E abriram um movimento amplo, com diversas pessoas e grupos (alguns até alvos de perseguição) que nos anos seguintes estimularam o tombamento em 1983 e o decreto da cidade como área de proteção ambiental em 1984.

Esse tipo de relação da cidade com seu meio ambiente, em tempos de preocupação também com a água em pleno século 21, depende tanto de informação e conhecimento como de afeto e conexão pessoal. Um dos principais símbolos da cidade ao lado de Terra da Uva ou de Jundiahy 400 Anos, esse patrimônio único da Serra do Japi está hoje em muitas partes do município oculto parcialmente por edifícios verticais vendidos com o argumento da vista para a serra… São os desafios do tempo.

Sem o acesso livre a trilhas e cachoeiras (como a “do tronco”) ou a locais antes tranquilos para músicos e sonhadores (como a fase inicial do “eucalipsom”), a organização, com restrições mas de forma não-elitista, desse relacionamento é essencial para manter vivo o espírito de proteção coletiva.

Convergência – A retomada do debate de estradas-parques ocorre simultaneamente na Prefeitura e na Câmara, que anteriormente já havia aprovado a extensão da lei de “congelamento” de projetos no território de gestão até 2032 – ou até a revisão da lei 417, de 2004, que trata especificamente dessa área enquanto a lei 8.683, do Plano Diretor, cuida do restante do município.

Na mesma região agora em foco, completando o arco da pressão antrópica, a região da Terra Nova tem em andamento o condomínio gigante da Alphaville em área de nascentes do rio Guapeva. Mas o bairro rural também tem uma rota turística, que também poderia ser outra das alternativas para o estudo de estrada-parque mais flexível.

Um detalhe curioso é que o assunto expõe também uma disputa linguística do cotidiano – não se fala em “avenida-parque”, mas em estrada-parque. Em Jundiaí, o nome histórico e popular das antigas estradas vai sendo apagado progressivamente como ocorre desde a Estrada do Corrupira ou a Estrada da Toca até a identificação desses projetos sobrepostos na serra como sendo na avenida Luiz Gobbo e avenida Paulo Ferraz dos Reis – em vez de na Estrada de Santa Clara ou Estrada do Paiol Velho.

Saindo das questões paralelas, um dos motivos da organização da área para esportes ecológicos como ciclismo, caminhadas e maratonas proposta pela Câmara, de autoria do ex-piloto de motocross e cavaleiro Cristiano Lopes, é o aumento desse tipo de uso e o surgimento de iniciativas particulares como trilhas específicas de MTB na divisa com Cajamar. Mas a regulamentação da lei, se promulgada pela Prefeitura, coincide com a discussão de estrada-parque lançada pelos gestores da área de planejamento e meio ambiente, Sinésio Scarabello Filho e Renata Freire.

De qualquer forma, ambas as propostas dependem de uma boa articulação entre poder público e iniciativa privada ou comunitária em consensos sobre os critérios de conservação, havendo ainda nessa área usos inadequados ou que precisam de novas orientações. Até, inclusive, pelos meios de implantação de melhorias, controle e manutenção. Com a atual crise, até mesmo os serviços públicos de resgate e cuidados com animais silvestres muitas vezes machucados em estradas são feitos de forma terceirizada pela Associação Mata Ciliar, que ficou dependente de doações nos últimos meses.

Debate de quase cem anos – Antes de chegar ao caso do Parque Estadual da Serra do Mar, , a pesquisa mostra que o tema das “estradas-parque” desenvolveu-se em partes da Europa e especialmente nos Estados Unidos. Na década de 1930, surgiu associado a rodovias – gerenciadas pelo Serviço Nacional de Parques e destinadas exclusivamente a veículos de passageiros para recreação, com pontos de parada para observação de paisagens, depois ampliados com outros usos como barcos, esportes, trilhas a pé ou a cavalos e áreas de piqueniques.

Uma tabela dessa pesquisa de mestrado (veja íntegra) mostra o crescimento das categorias de estradas-parques. Cada situação pode ter características próprias: o estudo na Serra do Mar, por exemplo, propõe uso de veículo especial adaptado e restrições a veículos particulares. Mas no cenário mais amplo elas contam naquele país com os nomes de parkroads (acessos a parques), parkways (vias cênicas), byways (trilhas/estradas de comunidades), highways (rodovias comuns com possibilidade de paisagens) e greenways (trilhas de exploração).

O assunto é instigante. Em Jundiaí, esse tempo de cem anos mostraria que uma estrada colonial como a de Pirapora estava não apenas na serra, mas também até a praça da Bandeira, onde saíam e chegavam as romarias de cavaleiros do Centro até há poucos anos. Harmonizar a ideia de estrada, que no Brasil é geralmente um vetor de destruição, com a ideia de parque, que no nosso idioma confunde diversão e o sentido de conservação, não é tarefa pequena.

Como define a Fundação SOS Mata Atlântica, estrada-parque seria uma categoria que busca “não apenas preservar as belezas cênicas, o bem cultural antropológico, arqueológico e histórico, mas também estimular a cidadania e a geração de renda para a população local”.

Esse objetivo parece algo tão próximo dos sonhos de 1978 como o aumento da reserva biológica surgida em 1991 e onde contamos com as trilhas de excelentes monitores, e mesmo de propostas de parque federal ou estadual em outras partes da serra. Nesse tema, o ideal seria um modelo de estrada-parque que pudesse ser adaptado também em outras partes da zona rural da cidade.  Viva o Curuquiã.

José Arnaldo de Oliveira é jornalista e sociólogo

 

Prev Post

Galera da Bem-Te-Vi acerta o…

Next Post

“O Reizinho Mandão” traz artistas…

post-bars

Leave a Comment