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Jundiaqui

2 de agosto de 2017

Os cantos do Japy

Por José Arnaldo de Oliveira

Deveríamos sentir arrepios quando usam o termo “rio Jundiaí”, uma tradução completamente equivocada. O motivo é que Jundiahy, nosso nome indígena de origem, já tem o seu significado tupi como rio dos jundiás.  É bastante simples notar que, como nos grandes filmes estrangeiros que chegam aos cinemas com títulos escalafobéticos, também criamos um nome redundante para as águas do vale em que vivemos. Em uma visão intercultural o nome aportuguesado ficaria algo como “rio do rio dos jundiás” na língua geral.

Isso parece bobagem em tempos de comida festefude, em leitura irônica do idioma anglosaxão. Mas não estou pensando no consumo. O próprio significado de Jundiahy para toda a região de suas montanhas, colinas e vales deveria ser usado para as políticas regionais que estão em debate nas cidades do Aglomerado Urbano.

Da mesma maneira é preciso pensar no significado do Japy, outro nome indígena de origem que permaneceu sem tradução específica. O Museu Histórico, nos tempos em que o escultor Mozart da Costa trabalhou com o historiador Geraldo Tomanik, obteve um pássaro empalhado conhecido por esse nome, mas de outro estado. Por outro lado, já apontaram seu significado para o mesmo “castelo de águas” usado pelo geógrafo Aziz Ab’Saber na justificativa do tombamento obtido depois das passeatas ecológicas dos anos setenta e oitenta.

Quem já esteve em algum canto (físico) do cinturão verde da serra e da zona rural e sentiu o canto (musical) de algumas de suas 300 espécies de aves pode entender que o silêncio é uma condição ambiental para essa e outras maravilhas. Essa complexidade tão simples deve fazer parte do significado de Japy, deduzida pela origem indígena, pelos pesquisadores da ciência e pelos amantes da natureza.

Estamos comemorando a privatização do aeroporto, mas é preciso atenção para o patrimônio semântico guardado nessas palavras. Qualquer pessoa pode sentir hoje uma agressão sonora já existente e a necessidade de cuidado com qualquer aumento desse limite.

Em vez de apenas estatizar o fruto das lutas ancestrais da comunidade, é preciso mesmo apoiar pequenos empreendimentos sustentáveis na serra e no entorno rural de toda a cidade e multiplicar postos de orientação (e não de isolamento) nas entradas da área nos quatro municípios da serra ou com os dez vizinhos da APA Jundiaí.

Nosso desafio é avançar além dos preconceitos brancos e urbanos para resgatarmos a beleza e o sentido original de palavras indígenas e caipiras como Jundiahy e Japy. Um equilíbrio que exige unir coração, inteligência e diálogo.

José Arnaldo de Oliveira é jornalista e cientista político

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