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Jundiaqui

 Saudade do Mércio
29 de agosto de 2020

Saudade do Mércio

Por Nelson Manzatto

Conheci Mércio de Oliveira antes dele ganhar o apelido de “Azeitona”, dado por Ademir Fernandes na redação do “Jornal da Cidade” na década de 1970. Foi exatamente neste ano, 1970, que conheci Mércio, época em que era chamado de “foca”, nome dado a todos que tinham interesse em ser jornalista e buscavam um aprendizado.

Todo final de tarde, Mércio chegava à redação, onde eu era revisor de textos, com cadernos debaixo do braço, pois deixara a escola, e vinha em busca de pautas para serem cumpridas à noite. O responsável por lhe distribuir serviço era Ademir Fernandes, editor de Esportes, uma época em que o Amador era grande em Jundiaí. Futebol de salão, basquete eram alguns dos destaques. Mércio recebia a pauta e voltava à noitinha com os resultados dos jogos e as fotos tiradas. Nesta época, trocávamos apenas um “boa tarde”, por falta de conhecimentos pessoais.

Por um tempo, no ano seguinte, Mércio desapareceu do jornal. Quando retornou e abriu a porta da redação, a alegria de todos ao vê-lo foi maior que o riso do apelido que ganhou de Ademir Fernandes, naquela hora: Azeitona! Com farda verde-oliva, Mércio denunciava que estava no Quartel e o apelido tinha tudo a ver com seu tamanho e seu jeito sempre risonho de ser. Aliás, o sorriso era a marca de Mércio. Acho que ele não sabia fazer outra coisa, a não ser sorrir, a não ser mostrar a alegria de viver.

Saindo do quartel, efetivou-se como repórter no “Jornal da Cidade”. E foi nessa época que Erci Pavan foi contratada como revisora. Claro que o olhar de ambos logo se cruzou e surgiu uma paixão, um grande amor! E Erci cuidava com carinho deste assunto: enquanto Mércio escrevia num papel seu nome, ela vinha e fazia um coração na parte central do mesmo, demonstrando que eram dois nomes num só: uma paixão completa: mERCIo!

Depois de algum tempo nos separamos: deixei o jornal, casei, fui para Campinas e ele, casado com Erci e tendo deixado o jornal, foi trabalhar em São Paulo, com Afanasio Jazadji, fazendo o que gostava: polícia! Uma bela manhã nos encontramos na antiga rodoviária de Jundiaí, eu esperando Caprioli e ele o Cometa. À nossa frente víamos o prédio onde funcionava o “JC”. Matamos saudades, relembramos amigos e lá vem a condução para nos levar a outro destino. “Seja feliz”, disse Mércio, acenando da porta do Cometa. Esta frase virou norma na vida deste amigo.

O tempo passou, ele se formou em Direito e acabamos nos cruzando nas redes sociais. Com seu jeito alegre de contar fatos ou causos, Mércio perpetuou a frase que me dissera um dia, “seja feliz”, mas agora no plural. Seus textos terminavam sempre com um “sejam felizes”, por conta dos muitos amigos que tinha.

Há três ou quatro anos nos cruzamos na porta do Fórum. Ele no meio de advogados e eu passando ao lado onde fora apanhar um documento. Nos cumprimentamos com um simples movimento de cabeça, mas achamos que foi pouco: ele deixou a roda de colegas de profissão e veio me dar um abraço. Foi a última vez que nos vimos! A frase “seja feliz!” voltou a soar em seus lábios. Continuamos a trocar mensagens pelas redes sociais, a frase ele sempre repetindo e isso foi marcando minha vida: sempre ser feliz!

O sorriso nos lábios de Mércio, como já disse, era permanente, suas histórias sempre recheadas de humor. Mas a vida nos prepara surpresas que nem sempre conseguimos explicar. Numa noite de sexta-feira, meu telefone toca e era Aurélio, colega dos tempos do jornal. E foi ele quem me deu a notícia de que Mércio havia partido. Não sei porque, mas imediatamente lembrei do “seja feliz”. Agradeci a Mércio ter perpetuado em minha memória esta frase, porque felicidade é algo que devemos buscar sempre e muitas vezes a encontramos em amigos.

Mesmo que grandes amigos desapareçam de nossas vidas, mesmo que aquele olhar não cruze mais nossos caminhos, felicidade é algo que tem que ser semeada, regada, cuidada, porque ser feliz é conviver com quem gostamos, com que nos faz bem.

Uma cerveja no Bar do Mário, ao lado do jornal, uma feijoada numa tarde de sábado, na antiga Eletroradiobrás, um abraço no Fórum, um aceno do Cometa e um contar histórias que transformam nossas vidas. Era assim Mércio: um sorriso permanente e sua presença em minha memória desde os tempos que ele buscava serviço na redação do jornal. Há exatos 50 anos.

Amigos a gente não esquece, porque eles estão no nosso pensamento, nem que já fazem dois meses que partiu. Mas Mércio continua vivo em minha mente com seu “seja feliz!”

Nelson Manzatto é jornalista e escritor

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