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Jundiaqui

5 de julho de 2017

Visite antes que acabe: História de Pirapora vai desbotando

Cidade às margens do rio Tietê é famosa pelo turismo religioso, mas trata mal seus romeiros

Edu Cerioni

Cada ano que passa, Pirapora do Bom Jesus fica mais feia. Uma dolorosa realidade exibida no caminho pelo poluído rio Tietê, com suas espumas fétidas, e pela deterioração da cidade como um todo, em especial de sua memória religiosa. Triste sina essa.

Escrevo com propriedade, afinal conheço Pirapora de longa data. Agora em junho, pelo 34º ano seguido fui a pé de Jundiaí para lá em romaria na madrugada do Corpus Christi. E o que vejo é que as coisas só pioram – a dor das pernas fica até pequena perto da dor no coração quando a gente vai chegando e vê a pobreza e o abandono…

Este que é o último município da Grande São Paulo banhado pelo Tietê e que divide com Jundiaí, Cabreúva e Cajamar uma parte da Serra do Japi, parece ter sido abençoado por Deus, mas deixou sua natureza ser destruída pelos homens.

O Tietê, que dá peixes lá para o Interior, como em Zacarias (não é piada), por exemplo, cheira mal em Pirapora.

Espuma de poluição invade a cidade. Anos atrás cheguei a ver a espuma encobrindo pontes. Não estava assim agora, mas a água ainda é bem escura, suja mesmo e nas margens do rio existe todo tipo de lixo. Minha mãe conta de uma época romântica, nos anos 40, em que os casais passeavam de barco pelo Tietê em Pirapora, inimaginável hoje em dia. Ele também já serviu de ligação do povoado com a Capital.

A avenida Jundiaí, aquela que os romeiros daqui usam para chegar na cidade via Santa Clara, Capão da Onça etc, é uma favela horizontal. Tem lixo jogado por toda parte, cães famintos revirando os restos e barracos de madeira, que abrigam pessoas sem permissão para sonhar. Se vê no rosto delas isso.

Cidade antiga, fundada em 1730, Pirapora ficou velha literalmente. O Centro, a Igreja do Senhor Bom Jesus, as lojas, os banheiros públicos… não se vê uma obra nova, nada de nada.

Daí você pergunta: por que tanta gente continua indo pra lá em romarias? Só porque é tradição. E no meu caso, como pode ser para muitos, acho que sigo empurrado pela esperança de chegar um dia e ver que a cidadezinha voltou a sorrir. Com tanta poluição, cercados de problemas, o povo se esqueceu que um sorriso aquece os corações dos romeiros.

A Igreja é o centro das atenções e vem passando por reformas. Lentas, diga-se de passagem, embora não falte empenho ao padre Silvio Andrei para arrecadar mais fundos. Ele cativa os fiéis e faz com que muitos sejam generosos ao abrir o bolso. Até livro escreveu, chamado “Da Dor ao Amor” e virou celebridade, com fila especialmente das mulheres à espera de uma selfie e um autógrafo ao final das missas. Custa R$ 25,00 e você pode comprar também pela Saraiva.

Por falar em missas, são apenas duas – às 10 e 16 horas. Claro que lotam no Corpus Christi, com cadeiras espalhas nos corredores laterias, gente em pé. Uma estratégia, imagino, para segurar o povo lá e gerar mais renda para as lojinhas, os restaurantes, enfim o comércio todo. Porque depois da missa não há alternativa que não seja pegar o caminho da volta para casa.

No coreto, nunca vi nesses 34 anos que vou para lá uma única apresentação musical, uma pena.

Muitos dos 15 mil habitantes sobrevivem da venda de santinhos, fitinhas e todo tipo de lembrancinhas. Todo tipo mesmo: tem chapéu de praia, berrante, coqueteleira, chaveiro, enfim tem de tudo nas muitas lojinhas e barracas.

No feriadão ficam empetecadas não só de coisas como também de visitantes. Se não dá pra olhar o rio, se não tem missa, se os museus estão deteriorados… o jeito é matar o tempo de alguma forma, nem que seja olhando a bizarrice – que coloca lado a lado pilão, carrancas, chinelo de couro e queijo mineiro nas prateleiras empoeiradas.

Outra opção é pagar para ser fotografado em cima do touro ou do cavalinho.

Ah!, tem os tapetes com mensagens religiosas coloridas e feitos à base de serragem. Sim, algumas ruas no entorno da Igreja são enfeitadas durante a madrugada mas nada que empolgue. Vale lembrar que muitos cães pisoteiam um trabalho que merece louvor pela dedicação dos fiéis – e que desaparece na procissão ao final da tarde.

Na rua atrás da Igreja, tem o Seminário Nossa Senhora de Fátima, com um jardim cercado de um muro que deveria ser tratado como patrimônio histórico. As autoridades fecham os olhos para ele, como a tudo em Bom Jesus de Pirapora.

O muro tem uma duzia de pinturas feitas por diferentes artistas e que narram a história da cidade. Não descobri a época em que esses ‘quadros’ foram pintados, mas noto a cada ano que estão desbotando e desaparecendo. Alguns estão completamente comprometidos pela ação do tempo e irrecuperáveis – outros ainda podem ser salvos, fica o alerta.

Nada de bom eu vi? Vi a Imagem do Senhor Bom Jesus que fica atrás do altar e ilumina e renova a fé de milhares de romeiros todos os anos.

Dedico esse texto aos meus companheiros de jornada nestes longos anos: Marco Antonio Zamboli Gobi, Joca Garcia e Antonio Scarpinetti. Se Deus quiser, em 2018 a gente volta para lá…

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