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 Pandemia, depressão etc
13 de julho de 2020

Pandemia, depressão etc

Por Luiz Haroldo Gomes de Soutello
De acordo com o noticiário, o isolamento social imposto pela pandemia tem levado muitas pessoas a um estado de depressão. Não sou psicólogo, quem se formou em psicologia foi a Maria Helena, minha mulher, mas, como filósofo de botequim, arrisco dar palpite. Vejo duas causas prováveis para essa depressão. Uma é o convívio forçado consigo, nem sempre lisonjeiro. Outra é a falta de ter o que fazer. Como não sou psicólogo, não posso recomendar terapias para esses problemas, sob pena de incorrer em charlatanismo, mas posso compartilhar minha experiência pessoal.

Como acontece com a maioria das pessoas, eu também fiz grandes projetos de vida, na fase imatura. Por exemplo, quando eu tinha cinco ou seis anos, alguém perguntou o que eu queria ser quando crescesse, e a resposta provocou gargalhadas. Eu disse que queria ser bispo. Não queria ser padre, queria ser bispo. Fiquei injuriado com as gargalhadas, porque estava falando sério. Ainda bem que não perguntaram o motivo, ou é provável que houvesse mais gargalhadas. O motivo era que eu achava chiquérrima uma imagem de São Norberto, em elegante paramento de bispo, que havia (acredito que ainda esteja lá) na igreja de São José do Jardim América, onde eu assistia missa aos domingos.

Mais tarde, quando eu tinha dez ou onze anos, eu disse que queria ser detetive, porque foi com essa idade que eu li a saga completa de Sherlock Holmes. Dessa vez não houve gargalhadas, porém meu tio Amadeu, supondo que eu queria trabalhar na polícia, me aconselhou a estudar direito e prestar concurso para delegado. Não foi por isso que eu estudei direito, foi porque minhas ambições haviam crescido, eu havia passado a desejar ser um advogado famoso como o meu primo Rubens Gomes de Sousa, autor do anteprojeto do Código Tributário, coautor do anteprojeto da Emenda Constitucional nº 18/1965, e com dezenas de textos jurídicos publicados no Brasil e no exterior, alguns pela editora da Universidade de Harvard.

Menciono essa universidade em particular porque o Professor Oliver Oldman, com quem eu jantei na casa do Rubens, me ofereceu uma vaga para fazer a pós-graduação com ele, em Harvard. Dessa vez eu fiquei muito frustrado por não ter condições financeiras para aceitar o convite. Outra frustração grande, na mesma época, foi que o Rubens, de quem eu fui assessor na reforma tributária de 1965/1966, teve o segundo infarto e retirou-se da sociedade Pinheiro Neto & Gomes de Sousa, que na época era o maior escritório de advocacia da América Latina. Com isso, precisei procurar emprego em outros lugares, e acabei como um obscuro procurador do Banco Central.

Nem por isso, entretanto, me sinto deprimido ao conviver comigo mesmo no isolamento social da pandemia. Se a minha carreira como advogado não teve o brilho com que eu sonhei na juventude, não deixou de ser gratificante pelas tarefas complexas desempenhadas com sucesso, além de me permitir sustentar em um padrão confortável a Maria Helena, com a qual estou casado há mais de trinta anos, e o nosso filho Luís Filipe, que agora já tem vida independente como engenheiro eletricista formado na UNICAMP.

Então, estou certo de que você também pode conviver bem com a sua autoimagem durante o isolamento social, sem essa de depressão, porque com certeza realizou alguma coisa boa na vida, mesmo que não tenha sido como nos seus sonhos.

Quanto a não ter o que fazer, use a imaginação. As possibilidades são inúmeras. Aprenda a cozinhar, por exemplo, ou, se você já sabe, experimente fazer um prato bem diferente. O Fofão, que é músico, aprendeu a fazer camarão com molho de tamarindo, cogumelo com molho de ostra, e outras extravagâncias da cozinha tailandesa.

Se você não gosta de cozinhar, aprenda a fazer tricô: tem sempre alguém pedindo agasalhos para os pobres. Ou compre livros pela Internet. Só não fique o dia inteiro com o nariz enfiado na telinha do celular, porque isso é neurose.

No que me toca, tenho matado o tempo escrevendo crônicas para o JundiAqui. Mas, se você não está habituado a escrever, não recomendo que adote a mesma terapia, senão é o Edu Cerioni quem vai ficar estressado inventando desculpas para descartar o que não é publicável.

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