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Jundiaqui

20 de janeiro de 2018

Sabor Tang

Por Wagner Ligabó

Uma das piores coisas que existe é você não estar em paz consigo mesmo. É quando parece que seu número não está cabendo na sua carcaça. Tempos modernos…

Vivemos uma época assíncrona ao que considero verdadeiros hábitos de relação humana na acepção da palavra. Aquela relação entre as pessoas envolvidas em calor humano sincero e preocupação efetiva. Do jeito como aprendi ao longo de minha vida.

Ter amigos, por exemplo. Amigo de fato era aquela pessoa que você sabia o nome inteiro, onde morava, a data do aniversário, o telefone decor, pra que time torcia e, se bobear, até o signo. Essas coisas, que tanto caracterizavam a intimidade de um sincero relacionamento entre gente como a gente, atualmente perderam a cor. Empalideceu. Algo sabor Tang Mix!

A tal rede social- o milionário Facebook e seus congêneres – fizeram a gentileza de jogar uma pá de cal em cima do que se entendia por interrelação comunitária. Eles, “os misteriosos caras da nuvem”, é quem dão as cartas.

“Admirável mundo novo!” exclamaria Aldous Huxley! Eles que escolhem e sugerem seus amigos; bloqueiam o que acham o que você não deve dizer; te lembram dos aniversários dos amigos; fazem filmes à maneira deles para te agradar; comemoram, sem você pedir, um ano de amizade com alguém que você não tem a mínima ideia quem seja; decidem o certo e o errado, e por aí vai. Daí então, decorrência desta automação, acontecem coisas bizarras. É o caso do sujeito que coloca uma mensagem no ar e fica irado com seus “amigos do Face” – aqueles cinco mil amigos, todos identificados com fotos sorridentes – e só meia dúzia deste seu seleto rol de amigos curte. Não conformado com a indiferença, vai e coloca nova mensagem, agora reclamando do pouco caso, e aí, só três amigos concordam. Entra em depressão. Os amigos o abandonaram! Algo sabor Tang Uva!

Agora eu reclamar só por que sou do tempo que enviava carta pra minha namorada carioca – hoje minha mulher- e, ansioso, aguardava resposta que custava em não chegar. Era uma emoção gostosa todos os dias perguntar ansioso para o seu Pedro, porteiro do prédio onde morava: Chegou? Chegou?! Dava arrepio por dentro estar com a carta na mão e a expectativa de que juras as palavras trariam. Era um ritual para abrir o envelope. Bons tempos…

Eu pedia ligação telefônica nas manhãs de domingo porque era mais rápido, e só ia falar com ela no final da tarde. Mandava revelar um filme da minha maquina fotográfica Leica e ia buscar revelado dez dias depois. Tudo tinha a emoção da espera. Assava devagar. A vida passava lenta com tudo a seu devido tempo. Era ‘bão demais’…

Infelizmente as novas gerações não experimentam essa gostosa sensação da espera. Uma pena constatar que este detalhe de vida não existe mais. Hoje os prazeres são outros. Vive-se o imediatismo para tudo. Somos um mundo virtual globalizado. Se espirrarem na China, imediatamente somos avisados. Criam-se expectativas imbecis e aos montes. Perdeu a graça. Algo insosso como Tang Morango.

Hoje com um simples telefone à mão se tem tudo que um jovem da minha época sonhava em um dia ter: maquina fotográfica, filmadora, jornal, revista, gravador, correio, dicionário, livro, música, TV, pesquisa, enfim, tudo que, de forma individual, estes itens alentavam e preenchiam nossos dias com emoção, desejo e motivação. Hoje vemos um punhado de desmotivados no mesmo ambiente, todos olhando para a tela de seus celulares, não se importando com quem esteja ao seu lado. Já perceberam o desespero quando “cai a rede”?! Algo como sabor estressado de Tang Tangolé.

E as relações amorosas modernas? Insípidas e inodoras, abaladas por essa dependência da WEB. E o tal “ficar”, moda entre a moçada? Lembro quanto tempo para se pegar na mão da namorada, aquela que você havia pedido em namoro. Hoje é um simples ”olá”, simpatizou, ficou. A seguir, se bobear no mesmo dia, passa-se à antropofagia sentimental. Provou, não gostou, cospe fora e passa adiante. E ninguém reclama. E assim vão se sucedendo as experiências interpessoais de forma mecânica e o gostar verdadeiro – lembra dele? – vai cada vez mais submergindo a segundo plano. Um momento Tang sabor Cajá.

Triste realidade: fria, óbvia, vazia com emoção quase a zero, a não ser com os absurdos que este momento da Era de Aquarius conseguiu: transformar o ser humano num simulacro de “cyber man”. Não existem surpresas. Tudo já foi visto, e se você está “out” – se ainda não viu – estará do lado de fora e excluído das leis da tribo virtual. Será simplesmente um número a mais, feito o cadáver aguardando autopsia com uma etiqueta no dedão do pé.

Mundo sem graça. Pasteurizado, igual ao novo sabor artificial do Tang Laranja. O paladar Laranja está ultrapassado e deram-lhe “up grade”! Agora é o momento Tang Laranja Docinha!

Que a vida seja artificial, mas que seja doce…

Wagner Ligabó é médico e vereador

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