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Jundiaqui

 Valores invertidos
6 de dezembro de 2018

Valores invertidos

Por Kelly Galbieri

Algumas coisas me deixam perplexa. Indignada, talvez seja a palavra exata, por conta da hipocrisia de algumas pessoas que fazem a mesma coisa que criticam nos outros e usam a rede social para fazer de conta que são verdadeiros anjos. Falo desses que se passam por puros e castos que nunca fizeram nada de errado e que, portanto, podem apontar o dedo para todo mundo. Isto porque talvez não tenha feito EXATAMENTE a mesma coisa que critica no outro, mas se “esquece” que fez algo muito parecido.

Está muito enigmático isso, não? Explico.

No último final de semana uma notícia trágica estampou os noticiários jundiaienses. Segundo li nos jornais, que um casal gay estaria mantendo relações sexuais dentro de um carro em frente à casa de uma pessoa, que chegou e, após buzinar, dar farol alto, foi até o carro e colocou a arma na boca dos dois rapazes, os chutou e acabou atirando nos meninos (19 e 24 anos de idade). Deram entrada no hospital e o homem foi preso em flagrante.

Primeira coisa que quero deixar claro: essas informações eu obtive no jornal, então não sei se são exatamente assim que ocorreram. Não sei quem são as vítimas nem o autor dos fatos. Mas não são os fatos que quero discutir, porque entendo que este é um trabalho da polícia. Minha indignação se dá porque este material foi divulgado na internet e as pessoas foram comentar. E o que eu li foi um festival de bobagens, de homofobia, de hipocrisia.

Primeiro: o comentário era de que carro não é lugar “disso”. Óbvio que carro não é o lugar ideal, que é perigoso, que a frente da casa dos outros deve ser respeitada, mas primeiro penso que todos fomos ou somos jovens e já fizemos algumas coisas no impulso da juventude e depois que isto JAMAIS legitima uma (ou duas) tentativas de homicídio. E este é o foco.

Segundo: Óbvio que tudo isso aconteceu porque eram dois homens. Se fosse um casal com um homem e uma mulher, tenho certeza que tal situação não ocorreria. Porque isso não é tão raro de acontecer. O que poderia ocorrer é o dono da casa “botar o cara para correr”. Afinal não “chocaria”.

Terceiro: o que mais me chocou foi este comentário que li aos montes:
“Como podia chegar em casa com sua família, seus filhos e ver uma cena daquelas? É muito chocante.” MEU DEUS… Será que choca ir até o carro ver o que está acontecendo lá dentro? Traumatiza? Mas ver um homem enfiar uma arma na boca de duas pessoas, atirar para matar não traumatiza? Que mundo é esse? Trauma por tentativa de homicídio não é trauma? Eu não me recuperaria nunca mais se eu visse isso.

E ninguém (ou quase ninguém porque não consegui ler todos os posts) pensou neste tipo de trauma. Apenas no trauma do curioso que iria até o carro para mostrar que sua arma manda mais.

Acho que temos que repensar os valores. Para cada ação tem uma reação e ela tem que ser proporcional. A irresponsabilidade de um ato deve ser paga proporcionalmente de acordo com a atitude tomada.

Espero que neste caso seja mesmo. E que sirva de lição para os puritanos de plantão não se entusiasmarem. Afinal não somos tão perfeitos quanto queremos parecer nas redes sociais. E temos filhos, pais, parentes que também não são… não é mesmo?

Kelly Galbieri é advogada e assessora de Políticas para Diversidade Sexual na Prefeitura de Jundiaí

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