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Jundiaqui

14 de setembro de 2018

Um ano após censura, peça de Jesus trans luta contra preconceito

Jundiaí ainda não abriu seus palcos para Renata Carvalho, que segue se apresentando onde consegue driblar a intransigência

Edu Cerioni

“Jesus pode ser tudo, menos travesti”. A frase de Renata Carvalho, que ganhou manchete no jornal “El País” – sim, a história corre o mundo todo -,  reflete o preconceito que enfrenta desde que tentou se apresentar em Jundiaí. Há exato um ano, em 15 de setembro de 2017, a peça “O Evangelho Segundo Jesus – Rainha do Céu” foi censurada aqui na cidade, onde até hoje segue sem ter sido encenada, mesmo com a liminar cassada. A decisão polêmica de um juiz jundiaiense teve dois efeitos desde então: um, de divulgar ainda mais o trabalho e outro, de atiçar a ira de intransigentes Brasil afora – nesse que é o país que mais mata membros dessa comunidade LGBT.

O monólogo no qual sai o manto de cristo e entra o vestido de tubinho também foi vetado no Rio de Janeiro, Londrina (Paraná), Belo Horizonte (Minas Gerais), Salvador (Bahia) e Garanhuns (Pernambuco), um total de seis cidades. Mas Renata segue na luta, até porque a agenda engordou neste último ano, com casa cheia onde é aceito. E foram mais de cento e cinquenta teatros nos mais diferentes recantos desse país em que direito à liberdade de expressão está previsto na Constituição Federal de 1988, embora nem sempre respeitado.

“O Evangelho Segundo Jesus – Rainha do Céu” mostra Cristo como uma mulher transexual, interpretado pela atriz Renata Carvalho, para quem há muita perseguição e ódio sem que as pessoas ao menos tenham se dado o trabalho de conhecer o conteúdo da peça.

“Nós ainda estamos lutando para ser consideradas humanas, em pleno 2018, é triste”, diz. Renata fala em criminalização do travesti no Brasil, uma transfobia de religiosos a partir da canetada do juiz de Jundiaí que ganhou apoio, entre outros, do prefeito Luiz Fernando Machado, que declarou que “defende como pai, esposo e prefeito a família tradicional”.

A peça, que tem uma hora, traz um sermão sobre os preceitos de amor e respeito ao próximo. Ela estreou no Brasil em 2016, mas aqui não pôde ser levada ao palco do Sesc porque “a exibição vai de encontro à dignidade cristã, posto apresentar Jesus Cristo como um transgênero, expondo ao ridículo os símbolos como a cruz e a religiosidade que ela representa”, segundo a sentença. Ao “El País” a diretora Natalia Mallo desabafou: “E o mais surpreendente é que todo esse ódio vem de pessoas que se autointitulam cidadãos de bem e defensores da palavra de Deus”. E vai além: trata-se de censura à arte.

Entenda o caso:

Em 11 de setembro de 2017, o JundiAqui divulgou que “No teatro do Sesc, Jesus volta na pele de mulher transgênero”, espetáculo para 220 pessoas e gratuito. Era o mês da Parada LGBT (que este ano será dia 30 próximo) e de manifestações contra a homofobia na cidade, que virou símbolo de censura. A apresentação seria dia 15, quando surgiu a decisão do juiz Luiz Antonio de Campos Júnior em caráter de urgência ao pedido impetrado pela advogada Virginia Bossonaro Rampin Paiva, vista então como uma defesa “à dignidade da fé cristã, na qual Jesus Cristo não é uma imagem e muito menos um objeto de adoração apenas, mas sim o filho de Deus”. A peça não foi apresentada, embora o público estivesse lá para conferir.

 

Em 19 de fevereiro de 2018, após cinco meses de espera, o Tribunal de Justiça de São Paulo derrubou a liminar que proibia a encenação de “O Evangelho segundo Jesus” no Sesc Jundiaí. A decisão foi por unanimidade e o desembargador Mônaco da Silva defendeu que “ninguém precisa concordar com o conteúdo da peça, mas isso não é motivo suficiente para alguém bater às portas do Judiciário para impedir a sua exibição. Basta não assistir ao espetáculo!” Ele destacou o caráter ficcional da peça e viu que não há intenção de ultrajar a Fé Cristã. O relator afirmou ainda que impedir a exibição é censurar a atividade artística, violando a Constituição Federal.
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