“A pandemia e Jack o Estripador”, por Luiz Haroldo
O serial killer famoso seria um príncipe que morreu por conta da gripe?
Luiz Haroldo Gomes de Soutello
A pandemia de gripe de 1889-1892, a respeito da qual pouco se fala, matou um milhão de pessoas. É, um milhão, em número redondo estimado. Para quem entende dessas coisas, acredita-se que foi causada pelo vírus H3N8 ou pelo vírus H2N2.
A mais famosa vítima dessa pandemia de gripe foi o Príncipe Albert Victor Christian Edward, Duque de Clarence (1864-1892), conhecido como Eddy, neto da Rainha Victória e filho mais velho do Príncipe de Gales (o futuro Eduardo VII).
O Príncipe Eddy era, portanto, o segundo na linha de sucessão à Coroa do Império Britânico, e teria sido rei se não tivesse morrido de gripe.
A morte prematura do Príncipe Eddy, aos vinte e oito anos, logo deu margem a uma teoria de conspiração segundo a qual ele teria sido assassinado por envenenamento, por ser um herdeiro inconveniente. Especula-se que teria sido amante de duas atrizes de teatro pornô, mas não existem provas concretas disso.
E não parou por aí. Um príncipe que morreu solteiro e sem herdeiros que possam processar alguém por difamação é um prato cheio para subliteratura sensacionalista.
Em 1962 começaram a dizer que o Príncipe Eddy era ninguém menos que o serial killer conhecido como Jack o Estripador, cuja identidade nunca foi descoberta. Essa acusação foi facilmente desmentida, porque na ocasião dos crimes do Estripador o Príncipe Eddy estava na Escócia, no Castelo Balmoral, a oitocentos quilômetros de distância de Londres.
Mas a subliteratura sensacionalista não abandona facilmente uma presa. Apenas mudaram um pouco a ficção para dizer que o Estripador seria o médico Sir William Gull, agindo em uma conspiração maçônica para ocultar o casamento secreto do Príncipe Eddy com uma prostituta de Whitechapel com a qual teria tido um filho que poderia reivindicar a Coroa. Delírio puro, é claro, para não dizer baba, mas que rendeu pelo menos duas adaptações para cinema, uma em 1988 (“Jack the Ripper”), estrelada por Michael Caine, e outra em 2001 (“From hell”), estrelada por Johnny Depp.
O Príncipe Eddy morreu solteiro, mas era noivo da formosa Princesa Maria de Teck, que acabou casando com o irmão dele, George V, pai de George VI e avô da atual Rainha Elisabeth II.
Outro neto, ou melhor, bisneto da Rainha Victória que também morreu com os mesmos vinte e oito anos, e também solteiro, foi Alastair Arthur, Duque de Connaught. Este morreu de hipotermia, em circunstâncias mal esclarecidas, mas não rendeu tanta fofoca, porque era apenas o décimo segundo na linha de sucessão.
O Luluzão que vos fala cometeu um livrinho intitulado “Por perto dos tronos”, que relata tudo o que se sabe a respeito da morte misteriosa de Alastair de Connaught e especula o que poderia ter acontecido com ele. O livrinho segue uma receita já explorada pelo autor, misturando história documentada com ficção e com humor. Como garantia de que não é subliteratura sensacionalista, mereceu um prefácio do ilustre Dr. Pedro Cavini Ferreira, um dos fundadores da Academia Jundiaiense de Letras. Vai para a gráfica quando terminar a quarentena. Vocês vão gostar do Alastair, especialmente as leitoras, porque ao contrário do primo Eddy, que tinha cara de tonto, Alastair era um pedaço de bom caminho…