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Jundiaqui

 A seriedade do Comendador Martinelli
22 de janeiro de 2021

A seriedade do Comendador Martinelli

Por Nelson Manzatto

Durante os anos de 1968 e 1969, período em que trabalhei na Rádio Santos Dumont de Jundiaí, minha convivência com o comendador Hermenegildo Martinelli foi praticamente diária. Afinal, ele apresentava o programa “Sorrisos de Nossa Senhora”, às 18 horas, diariamente, e era neste horário que eu trabalhava.

Meu programa diário era das 17 às 18 horas, depois, fazia a passagem para o programa religioso, e assim que encerrava, fazia a passagem para o programa de esportes, das 18h20 às 18h30 e, em seguida, entrava o programa “Hora Nipônica”.

E o comendador chegava sempre cinco minutos antes do horário. Sentava no estúdio com seus livros de meditação e oração e aguardava pacientemente seu horário.

Como quase todos os dias havia um sacerdote para uma reflexão, Martinelli acompanhava este momento até o final, mesmo não intervindo mais ao microfone.

Sua ação diária, quando havia o sacerdote – e muitas vezes era o bispo Dom Gabriel quem entrava ao vivo, mesmo que por telefone – , se resumia na oração do Angelus. Se sozinho, a reflexão se estendia até o final do horário.

Sempre de terno, gravata borboleta, o comendador, que também era vereador nesta época, esboçava um pequeno sorriso ao chegar, cumprimentando com seu “Boa tarde” e repetia a mesma postura ao se despedir, agora com o já “boa noite”.

Por conta de ser vereador, nas noites de quarta-feira, quando havia sessão – e ela era sempre transmitida pela Santos Dumont – o comendador abandonava os livros de meditação e chegava ao plenário com pastas com documentos para saber o que falar e fazer nos momentos de votação ou de troca de informações entre os políticos. E quando chegava ao plenário, fazia questão de acenar para a equipe da rádio presente ao local. E a equipe era o técnico de som e eu.

Foi vereador entre 1948 e 1976, sendo secretário, vice-presidente e me lembro que certa vez – das poucas em que conversávamos no estúdio – comentou que a Rádio Difusora de São Paulo fizera uma enquete e ele foi eleito o “Vereador do Ano”. Seu sorriso foi mais prolongado do relatar o fato.

Digo que conversávamos pouco, primeiro porque, por conta de seus afazeres, o comendador chegava ao estúdio “em cima da hora” e eu não podia estender diálogos por conta do programa que comandava. E ao final do “Sorrisos de Nossa Senhora”, já estava eu novamente no estúdio anunciando o programa de esportes e o comendador já tinha ido embora.

O “sorriso sério” do comendador ficou marcante em minha vida. Quando deixou este mundo em agosto de 1979 eu já não estava nem na rádio e também nem no jornal. Desenvolvia minha empresa de prestação de serviços. E me lembro da multidão que foi dar seu adeus a um dos vereadores que mais vezes foi reeleito.

Nelson Manzatto é escritor e jornalista

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