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Jundiaqui

 Mércio de Oliveira: Papai Noel foi o grande contador de história dessa cidade
27 de junho de 2020

Mércio de Oliveira: Papai Noel foi o grande contador de história dessa cidade

Alguns achavam que era mentira, só que não: era talento para criar, entreter e sempre vendo o lado bom da vida

Edu Cerioni

Roda de conversa boa sempre tem o grande contador de causos no centro das atenções. Mércio de Oliveira foi mestre nisso. Foi enterrado aos 68 anos neste triste sábado (27) cinzento, de chuva e frio, depois de brigar bravamente desde 31 de maio pela vida dentro de hospital.

Primeiro ele entreteu a garotada da sua Vila Argos Velha, depois os alunos de Ana Paes e Instituto de Educação, ainda como o “Jarrão”. Entraram na roda a turma do jornalismo, na sequência os estudantes de Direito da UniAnchieta, tempos em que era o “Mércião”. Daí vieram os advogados de OAB, do Fórum e o pessoal do Rotary Club, já chamado de “Doutor Mércio”. Nunca mudou o jeito de tratar a todos de igual para igual, nunca tropeçou numa história – todas tinham final que todo mundo queria ouvir da boca dele, até as repetidas, porque sempre traziam algo novo no meio.

“Mentiroso? Tinha gente que achava isso, mas a história sempre era verdadeira, tudo era fato que ganhava graça na boca dele, porque criava um clima especial, sempre buscando o lado melhor da vida. Esse era um de seus grandes dons”, conta a filha Renata, advogada como o pai e sua sócia no Escritório Oliveira & Pavan, no Centro.

Mércio era casado com Erci Pavan, que conheceu nos tempos de escola e reencontrou para o sim eterno quando foi trabalhar no “Jornal da Cidade”. Juntos construíram família e até uma “mansão”, que ele brincava ser um montão de cimento grudado. Era o mesmo sujeito gente boa de quando viveu em quarto e sala.

Com Erci vieram os 4 filhos, Alexandre, que é formado em Direito e atua como policial militar em São Paulo – é cabo da PM -, a advogada Renata, Thays, que é fisioterapeuta, e a caçula Beatriz, também formada em Direito. São cinco netos: Bruno, Isadora, Lorena, Maryam e Layla. “Ele amou muito a vida, os amigos, mas nunca soube de ninguém que amasse tanto sua família”, assegura Renata.

Foram 45 anos de casados, de 48 que estão juntos. Mércio e Erci comemoraram a união em março passado, em almoço familiar no Campos dos Aleixos.

Na Vila Argos Velha, Mércio era figura conhecida. Os pais moravam na rua José do Patrocínio, onde hoje funciona uma casa de fogos de artifício. Era ali que explodiam risadas em sua infância, marcada por primas como Iracy Basiche e as irmãs Marlene e Maldi Zani, e a turma do parquinho, Pacheco, Edgar, Zé Angelo, Anita, Zinhar, Carló, Marcão, Valdecir, Mara e companhia.

Avós e pais de Mércio eram ligados à ferrovia e tecelagem e isso lhe rendeu lições de valorizar o trabalho e boas histórias que amarrava e puxava os ouvintes por diferentes trilhos.

Seu caminho profissional ele vislumbrou na adolescência, quando foi trabalhar no laboratório fotográfico do “JC”. Logo lhe deram uma câmara na mão. Não era bobo nem nada e já focou seu trabalho no rastro do genial italianinho Élio Cocheo, que o apadrinhou. Saiu para servir o Exército – mesmo com um sobrepeso – e no retorno viu uma chance de se tornar repórter policial. Pegou algo que poucos se interessavam – crime não tem horário para acontecer – e colocou um olhar todo seu ali.

Quantas tragédias ele narrou nas páginas do jornal que tinha Erci como revisora… Saiu do “JC” na grande greve de 1982 – na foto acima, junto com Cocheo, Fábio Pescarini, Fernando ‘Mergulhão’ Ramalho, Pedrinho Fávaro e sua filha Mari, Ari Vicentini e Dago Azzoni em jantar no Beira Rio.

“Morreu um dos meus pais como jornalista… Foi com ele minha primeira pauta como repórter-fotográfico, um corpo em decomposição de mulher, achado em um matagal da rodovia dos Bandeirantes – uma das fotos ajudou a polícia a desvendar um sequestro depois, porque o filme do perito queimou. Numa caixa amarela de papel fotográfico da Kodak, guardada na casa da minha mãe, há uma foto do Mércio cortando meu cabelo na redação do ‘JC’. Era o trote pela minha aprovação no vestibular de jornalismo”, recorda Fábio Pescarini, que trabalha no grupo “Folha de São Paulo”.

Depois da greve que parou o jornal, ele fez sua voz ecoar além das fronteiras de Jundiaí. Foi contratado pela Rádio Capital para fazer parte da equipe policial do famoso Afanasio Jazadji. A Capital era retransmitida por outras várias rádios e isso fez dele uma pessoa muito conhecida.

Como lembra Renata, “depois de brigar com meio mundo em São Paulo”, retornou para Jundiaí em 88. Trabalhou então no “Jornal de Jundiaí” (foto acima), na Rádio Cidade, na Difusora Jundiaiense e, paralelo, fez o que Afanasio lhe inspirou, estudar para ser advogado. Teve reportagens assinadas em jornais como o “Estadão” e outros. Seguiu na Difusora até esta ser vendida para um grupo religioso em 1992, quando fazia programa junto com Reinaldo Basile, outro de seus grandes mestres. Foi a despedida do jornalismo – recusou depois o meu convite para entrar na equipe do “Jornal Bom Dia” em 2005. Agradeceu a lembrança, mas já vivia outra história de vida.

Como advogado, se você pesquisar no Google, vão aparecer 765 processos na área criminal, sua especialidade. E foram muitos outros na trabalhista também. Renata entrou para seu escritório em 1995 e desde 99 era sua sócia.

Essa foi uma coisa para poucos: Mércio foi Rei Momo do extinto bloco carnavalesco Estamos na Nossa nos anos 70, espalhando alegria junto com Erazê Martinho, Picôco Barbaro e outros foliões. Depois, para muita criança (parte já adultos agora), ele sempre será lembrado como o Papai Noel.

Teve bigode e barba por anos e anos a fio, nunca brancos, por isso tinha que recorrer a um truque para se fantasiar e fazer as vezes de o Bom Velhinho. Só de Rotary Club, animou o Natal entre 1993 e até 2018. Contou em 2018 na festa do Rotary de Jundiaí Leste – ele era sócio do Oeste só que agitava o Natal de todos os demais – que certa vez foi convidado para trabalhar como Papai Noel remunerado, mas não quis saber de quebrar o encanto que ele próprio vivia nas noites de dezembro. No último Natal, em 2019, ele já estava doente e foi ausência muito sentida, sem substituto na entrega de presentes.

Sua saúde começou a se complicar em setembro e desde maio passado estava internado. O Jarrão, que chegou a pesar 232 quilos, foi embora com 72. Um caminho leve pela frente, acreditam os amigos.

Fotos: Edu Cerioni e Arquivo Professor Maurício Ferreira/Sebo Jundiaí

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