
À espera de um milagre
Por Wagner Ligabó
O que mais me dói, fere meu coração e acaba com meu dia, é, ao sair do hospital e passar pela escada que dá acesso à rua, ouvir o lamento inconsolável, o choro soluçado e triste – aquele que machuca a alma – de familiares abraçados tentando se consolar com a perda de um ente querido. Um pranto dolorido. É muito triste.
A morte fere de morte a quem fica. Na minha vida são anos de profissão a lidar com este drama, mas sempre insistindo em acreditar que a vida não é só o que vivemos. Existe algo mais a nos esperar.
Entretanto agora, em meio a esta epidemia, sendo extremamente realista, a dor da perda é maior, pois este maligno surto viral é um assassino sorrateiro, rápido e impiedoso. Diferente das outras doenças ele chegou sem avisar e sem dar tempo para o mundo se preparar para combatê-lo. Um ataque de assalto como só se vê em cinema.
Eu, no ano de 1974, um jovem acadêmico de medicina, fui linha de frente no combate à epidemia pela meningite meningocócica, momento aterrador pelas tantas mortes que todos os dias se repetiam sem respeitar idade, sexo e cor. Jamais imaginaria ver novamente algo parecido, pois foi uma tragédia que marcou minha vida. Entretanto nada se compara ao que se vê agora.
Mas o homem, que se imputa o selo de ser o único animal racional e a mercê da ganância, vai na contramão da racionalidade. Por não ter respeito a ele mesmo ficou fazendo experiências, devastou a natureza, não teve limites em sua ambição e deu chance à produção de novos seres microscópicos que desembocaram em graves surtos infecciosos e agora atinge o seu ápice com esta catástrofe sem precedentes que paralisou o mundo.
Temo por nosso futuro. Aquele desejo de vivermos livres e sem medo como sempre foi, está violentamente abalado. A contragosto vivenciamos uma nova era atemorizante, repleta de incertezas e desassossego. E quais lições que dela retiraremos é o que mais me instiga. Nunca mais voltaremos a ser os mesmos.
No atual momento a ordem é torcer para não ser sorteado pela foice deste vírus e rogar para que acordemos deste sonho real com gosto de terror noturno. Nós, os de boa fé, não merecíamos passar por esta.
Continuo à espera de um milagre…