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 Pandemia e suspensão do tempo – Parte 3
7 de agosto de 2020

Pandemia e suspensão do tempo – Parte 3

Por Hildon Vital de Melo, o Camaleão Albino

Pandemia e suspensão do tempo é uma reflexão dividida em três partes sobre as novas relações com a quarentena prolongada e com a pandemia _ leia a Parte 1 e a Parte 2. O texto é um estudo inicial para análises sobre educação, cultura e sociedade em nosso Brasil atual cheio de vertigens, que mais parece roteiro de distopia.

PARTE III

Um olhar por sobre nossa sociedade expõe o agravamento de outras pandemias: desamparo social, violência doméstica, violência policial, adensamento dos problemas psíquicos e o estrangulamento de setores como saúde, educação e cultura. Em um país onde faltam as básicas condições de bem-estar à maioria da população; onde se revela praticamente nula a tentativa de se colocar em prática estratégias nacionais de contenção das mortes, sobra-nos observar o despreparo de dirigentes que ocupam os mais diversos cargos políticos.

A catástrofe avança, mas o tempo e a morte como experiências coletivas parecem ter cessado. Às parcelas da população que ainda mantêm o distanciamento social e ficam em casa parece restar a impressão da perda de sentido da quarentena. Às parcelas mais pobres e aos setores imprescindíveis no momento (limpeza, saúde, alimentação, transporte, entre outros) restam os riscos do contágio e a angústia dentro de uma rotina disparatada. (Vale ressaltar que até o momento não houve um debate sério e compromissado que priorizasse a importância do SUS, pouco se fala de efetivas parcerias com convênios de saúde e é quase nula uma verificação transparente dos gastos e licitações em planos emergenciais).

A letalidade da doença e os altos números de contágio parecem mínimos a alguns setores civis e da opinião pública massificada. A retração da economia e os índices de desemprego são colocados de forma muito simplória para o conhecimento da população. Presenciamos crises sucessivas da representatividade do(s) governo(s) e instituições. A construção difícil de setores de oposição ao governo e o sentimento de frustração popular são fatores que agravam ainda mais o contexto político: situação e oposição parecem fazer jogos encenados em uma atmosfera cada vez menos democrática.

Tudo isso parece ter sido retirado de um roteiro de filme distópico de ação, mas não é. É a realidade da conjuntura de um país que se moldou historicamente a partir dos genocídios de povos indígenas e africanos que aqui foram escravizados. Numa sociedade marcada por privilégios o desprezo pela vida está nas entrelinhas de um autoritarismo galhofento.

O país tem cumprido um dos principais papéis distópicos no cenário da política internacional, ou seja: somos um tipo de sociedade que muitas nações, a todo custo, querem desviar. A pandemia escancarou as raízes do autoritarismo e da violência contra as minorias – lembremos que aqui se trada das parcelas da população que são a minoria na aquisição dos direitos, o que é bem distinto de minoria em se tratando de números de indivíduos.

O cotidiano do país é a distopia. O Brasil é distópico. De repente fomos jogados numa espécie de idade média tropical e de tecnologia sucateada onde pessoas mais e mais morrerão em casa, onde a ineficácia dos serviços mais básicos se choca com certa nostalgia ingênua de um passado recente – pré-pandêmico – onde tudo estava mais ou menos horrível, porém um pouco menos do que agora.

Camaleão Albino: jundialmente conhecido como Hildon Vital de Melo. Escritor e pesquisador à deriva, mas professor de filosofia, por motivos de sobrevivência. E-mail: vitaldemelo@yahoo.com.br. Instagram: @canaleao_albino.

 

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